Até hoje a intolerância encontra guarida em muitos corações. O servo de Deus Papa Paulo VI, de saudosa memória, ofereceu
à Igreja, no ano de 1975, a Exortação Apostólica Evangelii Nuntiandi, a
respeito da evangelização no mundo contemporâneo. Quando muitos se perguntavam,
por influência de correntes de pensamento já dominantes naquele período, a
respeito do lugar da religião e da Igreja, esta se redescobriu na missão
evangelizadora. A palavra do Papa fez os cristãos deixarem de olhar para o
espelho, mirando seus próprios defeitos ou qualidades, para se voltarem para frente
e para o alto, descobrindo que cada geração tem a mesma responsabilidade de
anunciar o nome de Jesus Cristo.
Ainda no Antigo Testamento, um profeta chamado Jonas (cf. Jn
1,1-3,10) recebeu de Deus a difícil tarefa de anunciar a conversão. Sua primeira
reação foi a fuga, pois lhe parecia muito complicado enfrentar Nínive que “era
uma cidade fabulosamente grande, do tamanho de uma caminhada de três dias” (Jn
3,3).
Depois de um naufrágio e a aventura “no ventre do peixe”, aceita pregar
ao povo de Nínive. Se Deus queria que anunciasse a conversão, o profeta anuncia
destruição. E o povo entende conversão! O resultado foi uma grande tristeza
para o profeta: “Jonas ficou, então, muito amargurado e irritado. E assim orou
ao Senhor: “Ah, Senhor! Não era isso mesmo o que eu dizia quando estava na
minha terra? Foi por isso que eu corri, tentando fugir para Társis, pois eu
sabia que és um Deus bondoso demais, sentimental, lerdo para ficar com raiva,
de muita misericórdia e tolerante com a injustiça” (Jn 4,1-2).
Até hoje a intolerância encontra guarida em muitos corações.
Correm pelo mundo pressões sobre a Igreja, reações negativas às iniciativas de
diálogo e partilha com quem pensa diferente, como se não tivesse acontecido a
revelação de Jesus Cristo, Verbo de Deus encarnado. Deus teve muita paciência
com o povo antigo, cujos ideais e métodos muitas vezes incluíram levar à
perdição os inimigos. O Senhor Jesus nos convidou a dar a outra face, quando se
recebe um golpe, andar dois mil passos a mais com alguém e dar a capa a quem
tirar o manto. A experiência vivida por Jonas é anunciadora de métodos novos e
verdadeiramente revolucionários. Trata-se da revolução do Evangelho.
Depois da prisão de João Batista, Jesus iniciou a pregação
do Evangelho. Seu convite é provocante: “O tempo já se completou e o Reino de
Deus está próximo. Convertei-vos e crede no Evangelho” (Mc 1,14-20).
Converter-se é mudar de mentalidade, enxergar a realidade a partir de um ângulo
diferente. Os primeiros discípulos chamados por Jesus e os de todos os tempos,
nos quais estamos contemplados, deverão seguir Jesus, aprender com seus gestos,
acolher junto com ele os fracos e pecadores, para chegarem a reconhecê-lo como
Filho de Deus.
Os desafios à evangelização em nosso tempo são muito
grandes, mas o Espírito Santo, como sempre fez, conduz a Igreja de Cristo,
servidora do Evangelho, anunciadora da salvação. A Igreja Católica no Brasil
identificou algumas exigências para exercer a tarefa evangelizadora (cf.
Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora da Igreja no Brasil 134-15). O
serviço, que se concretiza especialmente na dimensão sócio-transformadora, com
toda a presença histórica da Igreja, na atenção aos pobres e na promoção
humana. Valem todos os esforços dos cristãos e das instituições ligadas à Igreja
para concretizar a caridade. Isso é evangelização.
Outro passo é o diálogo, que se concretiza na dimensão
ecumênica e do diálogo religioso, assim como no relacionamento respeitoso e
construtivo com todas as forças da sociedade civil. E no coração da missão
evangelizadora se encontra a exigência do anúncio explícito do nome de Jesus
Cristo, que se concretiza na dimensão missionária, através da qual os cristãos
hão de chegar até os confins da terra. É a razão de ser da Igreja. Enfim, o
testemunho da comunhão, que se concretiza na dimensão
comunitário-participativa, a vida das comunidades de Igreja, o relacionamento
entre as pessoas de fé, realizando a palavra de Jesus: “Que todos sejam um,
para que o mundo creia” (Jo 17,21).
Por onde começar? Segundo as situações e ambientes, a
evangelização pode se iniciar com o diálogo ou o serviço silencioso da
caridade. Outras pessoas sentir-se-ão atraídas por uma comunidade viva, na qual
todos se amam. A pregação explícita do Evangelho pode ser para muitos o primeiro
passo. Vale a pena perguntar-nos sobre o caminho que o Espírito Santo usou
conosco!
A Igreja não tem medo dos desafios, porque sabe que é
acompanhada pelo Espírito Santo de Deus, penhor das promessas de Jesus. Para
continuar sua peregrinação evangelizadora, pede ao Pai do Céu: “Dirigi a nossa
vida segundo o vosso amor, para que possamos, em nome do vosso Filho,
frutificar em boas obras”. A melhor delas é que a luz do Evangelho chegue a
todos os homens e mulheres de nosso tempo!
Dom Alberto Taveira Corrêa
Arcebispo de Belém - PA