sexta-feira, 17 de junho de 2011

A PROFANAÇÃO DA VERDADE




As ofensas à verdade



O Catecismo da Igreja Católica, ao falar das "ofensas à verdade", menciona, entre outras, as seguintes: – A mentira: é o pecado que "consiste em dizer o que é falso com a intenção de enganar" (n. 2482); – A calúnia, é o pecado cometido por "aquele que, por palavras contrárias à verdade, prejudica a reputação dos outros e dá ocasião a falsos juízos a respeito deles" (n. 2477). A calúnia, portanto, é uma mentira proferida com a finalidade de prejudicar a reputação alheia. Mas é importante ter em conta que se pode caluniar, mentindo de duas maneiras: – primeira, dizendo falsidades: este foi o caso lamentável da calúnia contra o Cardeal Bernardin, de Chicago, acusado há anos de pedofilia por um ex-seminarista. O Cardeal adoeceu do desgosto (pois toda a imprensa e a TV difundiram a calúnia) e veio a falecer. Quando estava já no fim, o acusador, movido por Deus, veio a público declarar que era tudo uma mentira, inventada por ele para vingar-se de uma repreensão (aliás, justa) recebida de Mons. Bernardin no seminário; – segunda, pode-se caluniar dizendo verdades; sim, dizendo verdades, mas verdades deturpadas, mal interpretadas, desfiguradas..., até transformá-las em mentiras. É já proverbial a frase que diz: "A pior mentira é a verdade mal contada". No processo que terminou condenando Jesus Cristo à morte na Cruz, esse foi o sistema seguido. Os membros do Sinédrio, os Sumos sacerdotes que decretaram a morte de Cristo e alcançaram de Pilatos a sua execução poderiam desafiar-nos, dizendo: – Provem que o que nós dissemos não é verdade. E, certamente, três foram as principais acusações contra Cristo: 1ª – Este homem disse: Posso destruir o Templo de Deus e reedificá-lo em três dias (Mat 26, 61). São João conta-nos palavras quase idênticas pronunciadas por Jesus, em resposta à indagação dos fariseus sobre a sua autoridade: Destruí vós este Templo e eu o reerguerei em três dias (Jo 2, 19); 2ª – O sumo sacerdote perguntou a Jesus: És tu o Cristo, o filho de Deus bendito? E Jesus respondeu: Eu o sou. Imediatamente foi condenado por blasfêmia: Ouvistes a blasfêmia, que vos parece? E unanimemente o julgaram merecedor de morte (Marc 14, 61-64); 3ª – Acusado diante de Pilatos de querer fazer-se rei e, portanto, inimigo do Imperador romano, quando Pilatos lhe perguntou: És tu o rei dos judeus? Jesus respondeu: Sim (Marc 15, 2). E esse foi o motivo por que Pilatos, pressionado pelos sacerdotes, o condenou, como constava do "título" que, conforme prescrevia a lei, mandou colocar no alto da Cruz: Jesus Nazareno, Rei dos Judeus (Jo 19, 19). Portanto, as três acusações que levaram Cristo a ser condenado à morte estavam baseadas em "verdades". Mas essas verdades eram "verdades profanadas", pois, pela deturpação com que foram contrafeitas, tornaram-se mentiras. Com efeito: – Jesus, ao falar da destruição e reedificação do Templo, como explica claramente o Evangelho, falava do templo do seu corpo (Jo 2, 21), que havia de ser destruído na Paixão e se reergueria três dias depois, ao ressuscitar. A "interpretação" dada era falsa, como se ele desprezasse o Templo, o lugar mais sagrado dos judeus, e estivesse ameaçando destruí-lo; – Ao proclamar-se o Messias, o Cristo Filho de Deus, Jesus dizia a pura verdade. Era mesmo– e é – o Messias, o Filho do Deus vivo, o Salvador do mundo. Bem sabia ele que essa verdade escandalizaria seus inimigos e seria apresentada como uma mentira blasfema; – Finalmente, ao dizer que era rei, também falava a verdade: Eu para isto nasci e vim ao mundo, dirá a Pilatos (Jo 18, 37), mas esclarecerá, face aos seus acusadores: O meu Reino não é deste mundo (Jo 18, 36), jamais tive a pretensão que me atribuem de reinar nesta terra. A Paixão, como disse Jesus aos que o prenderam no Horto das Oliveiras, é a vossa hora e o poder das trevas (Luc 22, 53). Deus, por um tempo, deixou mão livre a Satanás, e Satanás cumpriu o seu ofício específico, que é o de mentir. Como lembra o Catecismo da Igreja Católica, «O Senhor denuncia na mentira uma obra diabólica: "Vós sois do diabo, vosso pai..., nele não há verdade: quando ele mente, fala do que lhe é próprio, porque é mentiroso e pai da mentira" (Jo 8, 44)» (n. 2482). O que aconteceu na vida de Jesus se reproduz, ao longo da história, na Igreja, nas instituições da Igreja, na vida dos santos e, em geral, na vida daqueles cristãos que se esforçam por seguir sinceramente Cristo de perto. Pouco antes da Paixão, durante a Última Ceia, Jesus anunciou aos seus discípulos de então e de sempre: Se me perseguiram, também vos hão de perseguir; se guardaram a minha palavra, também hão de guardar a vossa [...]. No mundo haveis de ter tribulações, mas tende coragem, eu venci o mundo! (Jo 15, 20 e 16, 33).