sexta-feira, 20 de julho de 2012

Se eu fosse Nossa Senhora...



Não sei se você já se perguntou porque Nossa Senhora nunca apareceu no Brasil. Sei bem que ela tem aparecido a algumas pessoas aqui e ali. Estou falando das aparições grandes, famosas, para muita gente, com uma mensagem a nível global, algo que nos propusesse uma missão de alcance mundial, como em Fátima, que nos relembrasse algo importante, como em Lourdes, questionasse os valores de nossa sociedade, como em Medjugorje, ou que se solidarizasse com o sofrimento humano, como em La Salette.
Para ser bem franca, acho que qualquer coisa nos serviria. Bastava que ela aparecesse pessoalmente. Hoje, dia de Nossa Senhora Aparecida, não consigo controlar a pergunta que me inquieta: “Mas porque, Maria, você não aparece por aqui a não ser no fundo dos rios e igarapés em forma de imagem de madeira? Se imagens tuas reúnem milhões em Belém e centenas de milhares em Aparecida do Norte, já pensou o que seria se você aparecesse de verdade?”
Maria não me respondeu, mas fiquei a imaginar o que me diria. Será que responderia que a nós, brasileiros, basta a graça de Deus? Ou que são felizes os que crêem sem ver? Ou que não encontrou fé bastante sobre nossa terra? Ou ainda que não nos comportamos de formas a apressar sua visita? Ou que aqui a criação não geme e sofre dores de parto por uma manifestação de Deus? Ou que, se não ouvimos os profetas também não lhe ouviríamos ainda que descesse do céu? Ou que, como afirmamos, Deus é brasileiro e isso já é suficiente para a gente não precisar que ela apareça?
Não sei se ela escolheria uma dessas justificativas. Só sei que nossos jovens precisariam imensamente de uma aparição da Virgem em sua pureza, a conclamá-los à castidade, à continência, ao amor que diviniza o homem e a mulher. Como seria bom se Nossa Senhora aparecesse com uma mensagem assim para os jovens! Somos, ainda, mas por poucos anos, apenas, um país de jovens. Daqui a 50 anos seremos um país de velhos. Vê, Maria, você tem pouco tempo.
Outra idéia seria ela aparecer como em Cotignac, com o Menino, São José (que não apareceu junto com eles, mas a poucos quilômetros dali) e o Arcanjo Miguel. Já pensou? Seria uma mensagem formidável para as famílias, cujos membros não se relacionam mais com vistas ao amor, cujos pais perdem a referência de autoridade, cujos filhos são criados sem limites, cujas mães se ausentam de casa para trabalhar, estudar, evangelizar usando para estas atividades o tempo dos filhos. São Miguel, de quebra, na aparição, exorcizaria todo espírito de desconfiança, de divisão, de desunião! Fantástico!
Se nenhuma dessas idéias lhe servisse, poderia aparecer a alguma adolescente pobre, como a Bernadete. Alguma humilde como ela, inocente como ela, pobre e enferma como ela. Talvez atraísse nossas adolescentes que, nem bem toma forma o corpo, vendem-se nas praias em degradante turismo sexual e se desmancham em seguidos abortos, gonorréias e HIVs.
Outra sugestão seria aparecer para algumas crianças de qualquer favela, qualquer morro, qualquer colônia de pescadores ou aldeia indígena. Poderia pedir a construção de uma igreja onde sua figura permaneceria pelos séculos, como em Guadalupe. Poderia falar-lhes algo importante sobre o Menino Jesus, sua encarnação e missão no mundo. Poderia consolá-los dizendo como neles vê o seu próprio Filho, como os ama ainda que estejam largados nas ruas, ainda que não tenham escola, saúde, perspectiva de trabalho, amor e presença dos pais, ainda que sejam usados por traficantes, ainda que se lhes coloque uma arma nas mãos.
Ao invés de azinheiras, montanhas e grutas, poderia aparecer sobre um ipê, uma duna, em uma praça de alimentação, uma lan house, uma praia. Qualquer coisa, mas qualquer coisa, mesmo, nos serviria, desde que ela aparecesse, com grandeza e visibilidade, no Brasil. Se seu vulto no vidro de uma janela rendeu dezenas de reportagens na tv, já pensou o que aconteceria com uma aparição de verdade?
Teria mil argumentos para convencer Nossa Senhora. No entanto, ela não aparece. As filhas de Maria envelhecem a recitar o terço, as mil ave-marias se multiplicam nas casas, capelas, igrejas. O terço dos homens se multiplica nas esquinas, nas paróquias, nos escritórios, mas ela não aparece.
Vem-me, então, outra pergunta: “E se aparecesse, alguém mudaria de vida? Será que não suscitaria apenas mais uma enxurrada de devoções, de crendices, superstições que substituem as exigências da conversão ao Evangelho por palavras e rituais?” Talvez. É assim, muitas vezes, entre nós. Logo aparece uma novidade, uma devoção “forte” e substituímos a necessidade premente de conversão por rezas e novenas sem fim. Claro, elas não são más, de forma nenhuma. Mas não exigiriam mudança de vida?
É... Preciso desistir de tantas perguntas. Examinando bem, os videntes tinham uma vida santa antes de verem Nossa Senhora, ainda que, como no caso de Juanito, não conhecessem nossa fé. Mais que grutas e azinheiras, Nossa Senhora precisa de um coração aberto e uma vida disposta a ser totalmente modificada pela superexposição, perseguição, chacota e, especialmente, pelo poder devastador da graça recebida. Talvez, neste momento, ela esteja em busca de alguém assim, aqui mesmo, no Brasil, país de nenhum santo de origem nacional, mas onde, certamente, dezenas de milhares de pessoas têm o coração pronto para a sua visita. Você se disporia?

Maria Emmir Oquendo Nogueira