Secularização significa viver sem Deus, sem religião, porque
“século” significa “mundo”. Secularização é um estilo de vida, uma cultura, um
jeito de viver, sem fé, sem Deus, sem a dimensão espiritual da vida. Viver no
mundo, no século e sem transcendência. A medida de tudo é o próprio homem, a
razão humana. A isso chamamos de antropocentrismo. A política, a ciência, a
economia expulsaram a religião. Deus, além de inútil, virou um estorvo para o
homem secularizado. Ele não passa de uma projeção do homem fraco e doentio. A
secularização é a indiferença religiosa. Vive-se como se Deus não existisse. O
homem "inventou" Deus e agora O ignora e O descarta. Para ele, o
lugar de Deus é o exílio.
A secularização eclipsou a Deus, mas criou ídolos vorazes
que devoram tudo. A depredação do meio ambiente é consequência do egoísmo
globalizado e sem ética que provocou também a atual crise econômica e
financeira. Nossa realidade está construída sobre areia. A soberba da razão, a
atrofia espiritual, o culto estéril do individualismo, o vazio do coração, o
endeusamento do dinheiro, do sexo e do poder são rostos do “império do mal” e
da queda da atual civilização.
Ronda por aí a cultura da morte sob o manto do terrorismo e
da violência, e agora, da morte do ser humano eliminado no uso de
células-tronco embrionárias, que, na prática, leva à justificação do aborto.
Não só se pratica o mal, mas se tenta justificá-lo e transformá-lo em bem e em
expressão de progresso.
Secularização hoje é um estilo de vida sem Deus que impõe
modelos e critérios consumistas, cujos resultados são: a droga, o fracasso
familiar, a erotização da vida, a prática generalizada da corrupção, a
banalização da vida do feto e do idoso. A fome não foi exorcizada e aparecem
novas pobrezas. Vivemos numa situação de “iniquidade social”.
A própria secularização faz surgir uma “nova religiosidade
selvagem”, envolvida com interesses financeiros, exorcismos exploradores,
atitudes extravagantes, guerras santas; como dizia Santo Agostinho: “A
necessidade é mãe de todas as coisas”. Cresceram as religiões, mas não cresceu
o amor a Deus, ao próximo e a transformação do mundo.
O apóstolo Paulo escreve que se vivemos sem Deus, vivemos
sem esperança. Estamos no “século do medo”, reféns da depressão e do vazio
existencial. Uma vida sem amor e sem sentido é uma prisão. Essa realidade faz
explodir a indústria do divertimento, do armamento, dos desejos insaciáveis,
das necessidades desnecessárias, da lógica da força.
A secularização acaba deixando no ser humano a saudade de
Deus, do amor do Pai, da misericórdia do Filho, do desejo e da fome da verdade
e do bem. Render-se ao amor de Deus é o caminho de uma nova cultura, marcada
pela teologia da beleza, pela expressão da alegria e pela espiritualidade da
esperança: “Convertei-vos e vivereis”. Voltar para Deus equivale a reconstruir
a “civilização do amor”. Oxalá, a misericórdia divina, com Sua benevolência,
paciência e providência, nos alcance um coração de mãe para termos atitudes
filiais com Deus e fraternas com os outros.
A secularização não respeita um dado estrutural do próprio
homem que é a religiosidade, o desejo de Deus, a necessidade do sentido, da
verdade e do absoluto. Na realidade, o ser humano é mais espiritual que
material. É um ser de esperança. Construir um mundo sem Deus é construí-lo
contra o homem. O mistério e a fé são fundamentos para a existência. Ajudam a
pensar e alargam o alcance da razão. Quando a dimensão religiosa não é
resolvida ou foi desrespeitada, a fome de sentido da vida e as perguntas
existenciais ficam sem resposta. No lugar da oração, da meditação, da adoração
aparecem o vazio, a farra, o álcool, as drogas etc. O homem é um ser religioso.
Portanto, é questão de justiça o ensino religioso e a liberdade religiosa. A
secularização não constrói o verdadeiro humanismo.
Dom Orlando Brandes
Fonte: CNBB