Na escola de Cristo mestre
"A vida consagrada,
profundamente arraigada nos exemplos e ensinamentos de Cristo Senhor, é um dom
de Deus Pai à sua Igreja, por meio do Espírito. Através da profissão dos
conselhos evangélicos, os traços característicos de Jesus casto, pobre e
obediente adquirem uma típica e permanente "visibilidade" no meio do
mundo, e o olhar dos fiéis é atraído para aquele mistério do Reino de Deus que
já atua na história, mas aguarda a sua plena realização nos céus". A
finalidade da vida consagrada é a "configuração com o Senhor Jesus e com a
sua oblação total", de quem cada pessoa consagrada é chamada a assumir
"os seus sentimentos e forma de vida",o modo de pensar e de agir, de
ser e de amar.
A imediata referência a Cristo e
a natureza íntima de dom para a Igreja e para o mundo, são elementos que
definem a identidade e a finalidade da vida consagrada. Aqui, a vida consagrada
encontra, para si mesma, o ponto de partida, Deus e o seu amor, e o ponto de
chegada, a comunidade humana e as suas necessidades. Através de tais elementos,
cada Família religiosa delineia a própria fisionomia, da espiritualidade ao
apostolado, do estilo de vida comum ao projeto ascético, à participação na
riqueza dos próprios carismas.
De certo modo a vida consagrada
pode ser comparada a uma escola, que cada pessoa consagrada é chamada a
frequentar para toda a vida. Com efeito, ter em si os sentimentos do Filho quer
dizer colocar-se cada dia na sua escola, para aprender dele a ter um coração
manso e humilde, corajoso e apaixonado. Quer dizer deixar-se educar por Cristo,
Verbo eterno do Pai, ser cativado por Ele, coração e centro do mundo, e
escolher precisamente a sua forma de vida.
A vida da pessoa consagrada é
assim uma parábola educativo-formativa que educa na verdade da vida e forma na
liberdade do dom de si, segundo o modelo da Páscoa do Senhor. Cada momento da
existência consagrada é parte desta parábola, no seu dúplice aspecto educativo
e formativo. A pessoa consagrada, na realidade, aprende progressivamente a ter
em si os sentimentos do Filho e a manifestá-los numa vida sempre mais conforme
a Ele, a nível individual e comunitário, na formação inicial e permanente.
Deste modo, os votos são expressão do estilo de vida essencial, virgem e
completamente abandonado ao Pai, escolhido por Jesus sobre esta terra. A oração
torna-se continuação, na terra, do louvor do Filho ao Pai, pela salvação da
humanidade inteira. A vida comum é a demonstração que no nome do Senhor se
podem ligar vínculos mais fortes do que aqueles que provêm da carne e do
sangue, capazes de superar quanto possa dividir. O apostolado é o anúncio
apaixonado daquele pelo qual se foi conquistado.
A escola dos sentimentos do Filho
abre progressivamente, a existência consagrada também à urgência do testemunho,
a fim de que o dom recebido atinja a todos. Cristo, com efeito, "não
considerou o ser igual a Deus como algo a que se apegar ciosamente" (Fl 2,
6), não reteve nada para si, mas dividiu com os homens a própria riqueza de ser
Filho. Por tal razão, também quando o testemunho contesta alguns elementos da
cultura circundante, as pessoas consagradas procuram entrar em diálogo, para
partilhar os bens de que são portadores. Isto significa que o testemunho deverá
ser nítido e inequívoco, claro e compreensível a todos, para mostrar assim que
a consagração religiosa pode dizer muito a cada cultura, enquanto ajuda a
manifestar a verdade do ser humano.
Resposta radical
Entre os desafios colocados,
hoje, à vida consagrada está o de conseguir manifestar o significado igualmente
antropológica da consagração. Trata-se de mostrar que uma existência pobre,
casta e obediente faz ressaltar a íntima dignidade humana; que todos são
chamados, de modo diverso, segundo a própria vocação, a serem pobres,
obedientes e castos. Os conselhos evangélicos, com efeito, transfiguram valores
e desejos autenticamente humanos, mas também tornam relativo o elemento humano,
apontando "Deus como o bem absoluto". A vida consagrada, além disso,
deve poder evidenciar que a mensagem evangélica possui uma notável relevância
para o viver social do nosso tempo e é compreensível também para quem vive numa
sociedade competitiva como a nossa. Por fim, função da vida consagrada, é
conseguir testemunhar que a santidade é a proposta da mais alta humanização do
homem e da história: projeto que cada um
sobre esta terra pode fazer seu.
Na medida em que as pessoas
consagradas vivem, com radicalidade, o empenho da consagração comunicam as
riquezas da sua específica vocação. Por outro lado, tal comunicação suscita
também, em quem a recebe, a capacidade de uma resposta enriquecedora mediante a
participação do seu dom pessoal e da sua vocação específica. Tal
"confronto-partilha" com a Igreja e com o mundo é de grande
importância para a vitalidade dos vários carismas religiosos e para uma
interpretação deles ligada ao contexto atual e às respectivas raízes
espirituais. É o princípio da circularidade carismática, graças ao qual o
carisma torna, de certo modo, lá onde nasceu, mas sem se repetir. De tal modo,
a vida consagrada se renova, na escuta e leitura dos sinais dos tempos e na
fidelidade, criativa e operante, às suas origens.
A validade deste princípio é
confirmada pela história: desde sempre a
vida consagrada urdiu um diálogo construtivo com a cultura circundante, às
vezes interpelando-a e provocando-a, outras vezes defendendo-a e protegendo-a,
deixando-se solicitar e interrogar por ela, num confronto em alguns casos
dialético, mas sempre fecundo. É necessário que tal confronto continue também
nestes tempos de renovação para a vida consagrada e de desorientação cultural,
que corre o risco de frustrar a insuprímivel necessidade de verdade do coração
humano.
Na Igreja comunhão
O aprofundamento da realidade
eclesial como mistério de comunhão conduziu a Igreja, sob a ação do Espírito, a
compreender-se sempre mais a si mesma, como povo de Deus a caminho e, ao mesmo
tempo, como corpo de Cristo, em que os membros
estão em recíproca
relação entre si
e com a cabeça.
O plano pastoral, "fazer da
Igreja a casa e a escola da comunhão" é o grande desafio que, no início do
novo milénio, é necessário enfrentar para ser fiel ao desígnio de Deus e às
profundas expectativas do mundo. É preciso promover antes de tudo uma
espiritualidade da comunhão, capaz de se tornar princípio educativo nos vários
ambientes em que a pessoa humana se forma. Esta espiritualidade aprende-se
conduzindo o olhar do coração ao mistério da Trindade, cuja luz se reflete no
rosto de cada pessoa, acolhida e valorizada como dom.
As instâncias de comunhão
ofereceram às pessoas consagradas a possibilidade de descobrir a relação de
reciprocidade com as outras vocações, no povo de Deus. Na Igreja, elas são
chamadas, de modo particular, a revelar que a participação na comunhão
trinitária pode mudar as relações humanas, criando um novo tipo de
solidariedade. As pessoas consagradas, com efeito, professando viver por Deus e
de Deus, abrem-se ao dever de confessar a potência da ação reconciliadora da
graça, que supera os dinamismos desagregadores presentes no coração humano.
As pessoas consagradas, em
virtude da sua vocação, qualquer que seja o carisma específico que as
distingue, são chamadas a ser peritas em comunhão, a promover vínculos humanos
e espirituais que favoreçam a troca recíproca de dons, entre todos os membros
do povo de Deus. O reconhecimento da pluriformidade das vocações, na Igreja,
confere um novo significado à presença das pessoas consagradas no campo da educação
escolar. A escola é, por si mesma, o lugar da missão, onde se atualiza a função
profética conferida pelo baptismo e vivida, segundo a exigência de
radicalidade, própria dos conselhos evangélicos. O dom de especial consagração
que receberam levá-las-á a reconhecer, na escola e no empenho educativo, o
sulco fecundo em que o Reino de Deus pode crescer e dar fruto.
Este compromisso corresponde
perfeitamente à natureza e à finalidade da própria vida consagrada e exerce-se
segundo aquela dúplice modalidade educativa e formativa que acompanha o
crescimento de cada pessoa consagrada. O consagrado e a consagrada, através da
escola, educam e ajudam o jovem a acolher a própria identidade e a fazer
emergir aquelas necessidades e desejos autênticos que habitam o coração de cada
homem, mas que frequentemente são desconhecidos e subestimados: sede de autenticidade e de honestidade, de
amor e de fidelidade, de verdade e de coerência, de felicidade e de plenitude
de vida. Desejos que, em última análise, convergem para o supremo anseio
humano: ver o rosto de Deus.
A segunda modalidade está ligada
à formação.
A escola forma, quando oferece
uma proposta precisa de realização daqueles desejos, impedindo que sejam
deformados, ou só parcial e superficialmente satisfeitos. As pessoas
consagradas, que estão na escola do Senhor, propõem com o testemunho da sua
própria vida aquela forma de existência que se inspira em Cristo, para que
também o jovem vive a liberdade de filho de Deus e experimente a verdadeira
alegria e a autêntica realização, que nascem do acolhimento do projeto do Pai.
Missão providencial, a dos consagrados na escola, no atual contexto, onde as
propostas educativas parecem ser cada vez mais pobres e cada vez mais
desprovidas de uma resposta às aspirações do homem!
As pessoas consagradas, na
comunidade educativa, não precisam de reservar para si funções exclusivas. O
específico da vida consagrada reside no ser sinal, memória e profecia dos
valores do Evangelho. A sua característica é "introduzir no horizonte educacional
o testemunho radical dos bens do Reino", em colaboração com os leigos
chamados a manifestar, no seio da secularidade, o realismo da Encarnação de
Deus no meio de nós, "a íntima dependência das realidades terrenas em
relação a Deus em Cristo".
As diversas vocações existem em
função do crescimento do corpo de Cristo e da sua missão no mundo. A partir do
compromisso do testemunho evangélico, segundo a forma própria de cada vocação,
nasce um dinamismo de ajuda recíproca a viver, integralmente, a adesão ao
mistério de Cristo e da Igreja, nas suas múltiplas dimensões; um estímulo para
cada um descobrir a riqueza evangélica da própria vocação, no confronto pleno
de gratidão com as outras.
A reciprocidade das vocações,
evitando tanto a contraposição, como a homologação, coloca-se como visão
prospectiva, particularmente fecunda, para enriquecer o tecido eclesial da
comunidade educativa. Assim, as várias vocações desenvolvem um serviço para a
realização de uma cultura da comunhão. São vias correlativas, diversas e
recíprocas, que concorrem para a atuação plena do carisma dos carismas: a caridade.
Perante o mundo
A consciência de viver num tempo
cheio de desafios e de novas possibilidades, estimula as pessoas consagradas,
comprometidas na missão educativa escolar, a fazer render o dom recebido, dando
razões da esperança que as anima. A esperança, fruto da fé no Deus da história,
funda-se na palavra e na vida de Jesus, que é vivido no mundo, sem ser do
mundo. A mesma atitude, Ele pede-a a quem o segue: viver e trabalhar na história sem, porém, se
deixar fechar nela. A esperança exige inserção no mundo, mas também ruptura;
requer profecia e compromete umas vezes a aderir, outras a dissociar-se, para
educar na liberdade dos filhos de Deus, no contexto de condicionamentos que
conduzem a novas formas de escravidão.
Este modo de ser na história
exige uma profunda capacidade de discernimento. Nascendo da quotidiana escuta
da Palavra de Deus, facilita a leitura dos acontecimentos e dispõe a criar, por
assim dizer, uma consciência crítica. Quanto mais profundo e autêntico for este
compromisso, tanto mais será possível descobrir a ação do Espírito na vida das
pessoas e nos acontecimentos da história. Uma capacidade encontra o seu
fundamento na contemplação e na oração, que ensinam a ver as pessoas e as
coisas a partir da perspectiva de Deus. É o contrário do olhar superficial e do
ativismo incapaz de se deter no importante e essencial. Quando faltam a
contemplação e a oração e as pessoas consagradas não estão isentas deste risco
diminui a paixão pelo anúncio do Evangelho e a capacidade de lutar pela vida e
pela salvação do homem.
As pessoas consagradas, vivendo
com impulso de generosidade a sua vocação, comunicam na escola a experiência da
relação com Deus, radicada na oração, na Eucaristia, no sacramento da
Reconciliação e na espiritualidade de comunhão que caracteriza a vida da
comunidade religiosa. A atitude evangélica que se obtém, promove o
discernimento e a formação para o sentido crítico, aspecto fundamental e
necessário do processo educativo. Qualquer que seja o seu trabalho específico,
a presença das pessoas consagradas na escola contagia o olhar contemplativo,
educando para o silêncio que leva a ouvir Deus, a prestar atenção aos outros, à
realidade que nos circunda, à criação. Além disso, apontando sobre o essencial,
as pessoas consagradas suscitam a exigência de encontros autênticos, renovam a
capacidade de se maravilhar e de tomar cuidado do outro, descoberto como irmão.
Em virtude da sua identidade, as
pessoas consagradas constituem a "memória viva da forma de existir e atuar
de Jesus, como Verbo encarnado face ao Pai e aos irmãos". O primeiro e
fundamental contributo à missão educativa na escola, por parte das pessoas
consagradas, é a radicalidade evangélica da sua vida. Este modo de assumir a
existência, fundada na generosa resposta ao chamamento de Deus, torna-se
interpelação a todos os membros da comunidade educativa, a fim de que cada um
oriente a sua própria existência como uma resposta a Deus, a partir dos
diferentes estados de vida.
Nesta perspectiva, as pessoas
consagradas testemunham que a castidade do coração, do corpo, da vida é a
expressão plena e forte de um amor total por Deus, que torna a pessoa livre,
cheia de alegria profunda e disposta à missão. Assim, as pessoas consagradas
contribuem para orientar os jovens e as jovens até um pleno desenvolvimento da
sua capacidade de amar e a uma maturação integral da sua personalidade.
Trata-se de um testemunho importantíssimo, face a uma cultura que tende, sempre
mais, a banalizar o amor humano e a fechar-se à vida. Numa sociedade onde tudo
tende a ser garantido, as pessoas consagradas, através da pobreza livremente
escolhida, assumem um estilo de vida sóbrio e essencial, promovendo uma justa
relação com as coisas e confiando-se à providência de Deus. A liberdade em
relação às coisas, torna-as disponíveis, sem reservas, para um serviço
educativo à juventude, sendo sinal da gratuidade do amor de Deus, num mundo
onde o materialismo e o ter parecem prevalecer sobre o ser. Enfim, vivendo a
obediência, apelam a todos para a senhoria do único Deus, contra as tentações
de domínio indicam uma escolha de fé, que se contrapõe a formas de
individualismo e autossuficiência.
Como Jesus para com os seus
discípulos, assim as pessoas consagradas vivem a sua doação em benefício dos
destinatários da missão: os alunos e as
alunas, em primeiro lugar, mas também os pais e os outros educadores e
educadoras. Isto as encoraje a viver a oração e a resposta quotidiana ao
seguimento de Cristo, para se tornarem um instrumento cada vez mais apto para a
obra que Deus realiza através da sua mediação.
O chamamento a doar-se na escola,
em disponibilidade total, em profunda e verdadeira liberdade, faz com que os
consagrados e as consagradas se tornem testemunhas vivas do Senhor que se
oferece por todos. Esta superabundância de gratuidade e de amor estimulam a sua
doação, para além e acima de qualquer tipo de funcionalidade.
As pessoas consagradas encontram
em Maria o modelo em que se inspirar, no relacionamento com Deus e no viver a
história humana. Maria representa o ícone da esperança profética, pela sua
capacidade de acolher e de meditar longamente a Palavra no seu coração, de ler
a história segundo o projeto de Deus, de contemplar Deus, presente e operante
no tempo. O seu olhar deixa transparecer a sapiência que une harmoniosamente o
êxtase do encontro com Deus e o maior realismo crítico em relação ao mundo. O
Magnificat é a profecia por excelência da Virgem, que ressoa sempre novo no espírito
da pessoa consagrada, como louvor perene ao Senhor, que se inclina sobre os
pequenos e os pobres, para lhes conceder a sua vida e misericórdia.
Vaticano - Missão