Todas as gerações conheceram seus
profetas, pessoas que interpretam a realidade com critérios diversos, segundo
suas opções religiosas ou sua cultura. Também nossa época conhece seus
profetas, adivinhos em profusão, homens e mulheres que pretendem saciar a sede
de segurança das pessoas. Encontramos gente que, antes de sair de casa, faz
questão de consultar o horóscopo, que lhes possibilite receber de fora a
segurança que lhes falta por dentro. Sem desrespeitar a diversidade cultural e
religiosa em que vivemos, impressiona ver quantos consultam profissionais das
cartas ou das mãos, medrosos diante do dia de amanhã. Tenho dificuldades para
entender como alguém pretenda “amarrar” uma pessoa com laços de tipos diversos,
ou que se queira “trazer de volta a pessoa amada”, sem que os eventuais namoros
sejam fruto de um processo normal de simpatia e conquista, respeitada sempre a
liberdade da outra parte.
A objeção pode ser imediata, pois a Bíblia e a vida dos cristãos sempre
apresentaram seus profetas, cuja natureza e missão inquietam as pessoas. É que
na Sagrada Escritura, profeta não significa adivinho capaz e prever o futuro.
Elias, que simboliza toda a riqueza do profetismo do Antigo Testamento, era
muito mais o homem do zelo absoluto pelas coisas de Deus e pela causa de Deus.
Homem reto, incorruptível, capaz de alertar o povo e as autoridades para as
consequências de seus atos. É mais ou menos como uma mãe que, conhecedora da
vida, rica de sabedoria, alerta o filho, recomendando-lhe juízo, fazendo-lhe ver
as possíveis consequências de seus atos. Daí a convicção corrente a respeito de
uma eventual “praga de mãe”. Não é praga nem adivinhação, nem destino cego, mas
conhecimento adquirido ao longo de uma vida, que permite descortinar o sentido
dos passos a serem dados e suas consequências.
Mesmo que na história do Povo de Deus tenham existido profetas quase
profissionais, os autênticos se manifestam após um chamado explícito de Deus,
tantas vezes arrancados de seus afazeres, como Amós: “Não sou profeta nem
discípulo de profeta! Sou vaqueiro e cultivo sicômoros. Foi o Senhor Deus que
me tirou de detrás do rebanho e me ordenou: Vai profetizar contra Israel, o meu
povo!” (Am 7,14-15). De fato, Deus pode suscitar profetas no meio de seu povo,
como quer e quando quer. Em primeiro lugar o profeta é discípulo, amadurece no
seguimento da Palavra do Senhor, para só então abrir a boca em nome de Deus,
para corrigir, estimular e edificar a vida daqueles que querem fazer parte do
povo escolhido de Deus: “O Senhor Deus me deu uma língua habilidosa para que
aos desanimados eu saiba ajudar com uma palavra. Toda manhã ele desperta meus
ouvidos para que, como bom discípulo, eu preste atenção. O Senhor Deus abriu-me
os ouvidos, e eu não fiquei revoltado, para trás não andei” (Is 50,4-5).
Profeta é quem põe à disposição de Deus sua boca e sua vida, para que aquele
que o chamou e manifeste. Ele lança mais luzes sobre o presente do que sobre o
futuro, ajudando as sucessivas gerações na maravilhosa aventura da fé.
Mas como reagir diante do Apóstolo São Paulo, o mesmo que identificou o
ministério profético dentro das Comunidades cristãs, com o qual os cristãos são
incitados à fidelidade a Deus, quando ele mesmo falou de destino? De fato, eis
a palavra do Apóstolo: “Em Cristo, Deus nos escolheu, antes da fundação do
mundo, para sermos santos e íntegros diante dele, no amor. Conforme o desígnio
benevolente de sua vontade, ele nos predestinou à adoção como filhos, por obra
de Jesus Cristo, para o louvor de sua graça gloriosa, com que nos agraciou no
seu bem-amado” (Ef 1,4-6). Existe, então, um destino? No sentido do plano de
Deus de salvação, sim. Mas Ele não nos fez com algum tipo de controle remoto,
que nos impeça o uso da liberdade! Nós fomos pensados desde toda a eternidade –
somos criaturas! – para a felicidade, para a realização, para a vida eterna,
fomos feitos no amor e para o amor, fomos criados na Palavra eterna que sai da
boca do Pai, Jesus Cristo (Cf. Jo 1,3). E Deus não impõe o seu plano, não nos
escraviza, mas propõe! O Apóstolo São Paulo, testemunha do amor eterno de Deus,
exerce em relação às Comunidades a profecia da verdade e da realização humana
plena, na qual oferece a todos os elementos necessários às opções a serem
feitas no correr da vida.
Quando o Senhor chamou e enviou seus primeiros discípulos, deu-lhes a missão de
irem até os confins da terra (Mc 6,7-13). Nossa geração continua na mesma
estrada e com a mesma responsabilidade. Trata-se de dar testemunho do nome de
Jesus, dispostos a tudo, para constituir um povo de profetas, cujo modo de
viver oferecerá caminhos novos, provocará reações muitas vezes adversas, será
denúncia do pecado e estímulo ao bem, que o Espírito Santo plantou no coração
dos homens e das mulheres. Para sermos fiéis a esta missão, nós professamos a
fé cristã, sabendo que Deus mostra aos que erram a luz da verdade, para
voltarem ao bom caminho, e pedimos a graça de rejeitar o que contradiz a este
nome, e abraçar o que lhe convém.
Dom Alberto Taveira Corrêa, arcebispo de Belém do Pará
Dom Alberto Taveira Corrêa, arcebispo de Belém do Pará