A virtude
exige luta
Num artigo
já colocado neste site, considerávamos que só pode entender e valorizar a
castidade a pessoa que se sabe «chamada ao verdadeiro amor». Não vou repetir
aqui o que você talvez já tenha lido lá e pode ler clicando a palavra
“castidade” na chamada “nuvem de tags”.
Vamos partir
agora da ideia clara , exposta naquele artigo, de que a castidade é uma virtude
e que, por isso - como todas as virtudes humanas -, exige de nós esforço e
constância. Deve ser forjada na fornalha do amor e da graça de Deus, e deve ser
trabalhada com esforço.
Se tivermos
boa vontade, a nossa razão, iluminada pela fé, irá purificando e dirigindo de
modo certo o erotismo meramente emocional e instintivo; e a nossa vontade
tomará as rédeas dessa virtude na mão. Isso será possível se, além da ajuda de
Deus, conseguirmos o autodomínio mediante a mortificação cristã.
Todos temos
consciência de que não estamos vivendo no paraíso; não convivemos com anjos
imaculados; pureza e a fidelidade são apreciadas por muito poucos. Quer dizer
que, ou rezamos e lutamos, ou seremos engolidos pelo redemoinho da onda
dominante.
A onda
dominante
É evidente
que, na sociedade atual fortemente erotizada, a mortificação e o autodomínio se
tornam muito necessários. Por toda a parte - pessoas na rua, outdoors, espetáculos,
jornais, revistas, livros, moda feminina, Internet - há uma agressão contínua à
castidade, uma estimulação artificial e massiva da fisiologia, da simples
genitalidade, sem o menor contexto de grandeza e amor. Sexo pelo sexo. Sexo
como consumo e prazer.
Quem é que
alimenta esse ambiente materialista? É coisa sabida que a indústria da
pornografia fatura mais do que a das drogas; e que danifica corpos e,
sobretudo, almas, mais até do que a droga. Perante esse panorama, é preciso
reagir, se quisermos respeitar a nossa condição de seres humanos. “É necessária
- dizia há anos São Josemaría Escrivá - uma cruzada de virilidade e pureza que
enfrente e anule o trabalho selvagem daqueles que pensam que o homem é uma
besta. - E essa cruzada é obra vossa”, dos cristãos .
O papel da
mortificação, nesta batalha, é o “não” sereno e corajoso à sensualidade bruta
que permite dizer “sim” à beleza, à grandeza e à dignidade do amor: à grandeza,
em suma, da alma e do corpo dos filhos de Deus. Por isso, da mesma forma que
devo dizer um não rotundo à droga, para dizer sim à vida, tenho que saber dizer
o mesmo não a esses estímulos de mero hedonismo, para dizer sim ao amor, à
beleza da sexualidade integralmente humana, própria de um filho de Deus, de um
homem e uma mulher autênticos.
Ser donos do
nosso coração e do nosso corpo
Falamos de
autocontrole. Para alcançá-lo é importante, em primeiro lugar, praticar a
mortificação da gula, que tão facilmente nos descontrola (no comer, no beber,
nos caprichos). Essa mortificação ajuda-nos, bem mais do que imaginamos, a
manter o equilíbrio da castidade. “Tenho para mim - afirmava o abade João
Cassiano, no século V - que não poderemos jamais reprimir o aguilhão da carne,
se antes não conseguirmos refrear os desejos da gula”.
Ao mesmo tempo,
faz-nos falta cuidar delicadamente da mortificação dos olhos, janelas abertas
ao mundo e receptores principais da chuva constante de incentivos eróticos que,
infelizmente, há por toda a parte. Quem se estima a si mesmo, diz “não”: não
estou disposto a olhar tudo pela rua, nem a comprar revistas pornográficas, nem
a cair nas redes de programas noturnos da tv, nem a alugar fitas eróticas, nem
a pesquisar no lixo sexual da Internet; e diz “não” - insisto - porque está
decidido a dizer “sim” a um ideal de amor muito maior do que o mero prazer
carnal que faz o homem descer abaixo do nível dos bichos (que, diga-se de
passagem, costumam ser mais “castos” e regrados do que os homens nas suas
relações sexuais…).
Conselhos
práticos
Queremos
outras armas para alcançar esse autodomínio? Vou enumerá-las glosando
brevemente palavras de São Josemaría Escrivá:
- “A
«valentia» de ser covarde, para fugir das ocasiões”. Na maior parte dos
casos, este é o grande segredo, para não ter que repetir, de modo enfadonho,
aquela cantiga de que “a carne é fraca, não consigo me segurar”. Fugir das
“ocasiões” é evitar os lugares (um apartamento vazio, certas boates,
danceterias, etc.), as situações (um carro estacionado em lugar escuro) e
as pessoas que facilmente nos podem arrastar para a simples explosão genital.
Pense também em certos reveillons e carnavais comemorados em hotéis ou
clubes, em que a promiscuidade de rapazes e moças - envolta num festival de
álcool, drogas e música excitante - é convite quase inevitável para cair nos
maiores erros e excessos sexuais.
- Depois, “a
guarda atenta dos sentidos”. Já falamos da vista; poderíamos recordar a
importância de guardar também o ouvido, pequeno bueiro onde são despejadas
diariamente mil gracinhas sujas; e o tato, para não cair em familiaridades e
manifestações de afeto pegajosas, bastante “suspeitas”, que muita vez equivalem
a procurar tolamente migalhas de sensualidade, a pretexto de sermos
amáveis e cordiais; e ainda o controle, importantíssimo, dos chamados
“sentidos internos”: a imaginação e a memória.
-
Reconheçamos que noventa por cento dos erros sexuais procedem do descontrole
destes dois sentidos internos. Deixar a imaginação à solta - alimentada muitas
vezes pelas recordações de pecados cometidos, de conversas, de filmes, de
leituras, de imagens visuais procuradas - é a mesma coisa que escancarar as
janelas da alma a uma série de tentações constantes, que entram na alma como
uma revoada de cupins; se isso se repete, pode vir a criar facilmente um
transtorno obsessivo-compulsivo, patológico. Quem é dono da imaginação, tem
noventa por cento ganho para ser dono e senhor do seu corpo e dos seus
sentimentos.
-Finalmente,
nunca devemos esquecer a importância primordial dos meios espirituais, o que
exige concretização de propósitos e esforços perseverantes. Concretamente: “A
frequência dos sacramentos, de modo particular a Confissão sacramental; a
sinceridade plena na direção espiritual pessoal; a dor, a contrição, a
reparação depois das faltas, e tudo ungido com uma terna devoção a Nossa
Senhora, para que Ela nos obtenha de Deus o dom de uma vida santa e limpa”.
Esse último
pensamento - devoção a Nossa Senhora - não é uma simples pincelada piedosa. É
sabedoria e experiência milenar dos bons cristãos. Todo aquele que deseja
adquirir ou melhorar a virtude da castidade, além de tudo o que acima
lembramos, nada melhor pode fazer do que colocar-se, com inteira confiança, nas
mãos puríssimas da Virgem Santa. Posso dar aqui, com absoluta veracidade, o
testemunho de experiências conhecidas através de longos anos de trabalho
sacerdotal. Muitas vezes (não só algumas, mas muitas vezes) tenho visto a
alegria com que jovens e menos jovens, que se consideravam incapazes de vencer
a batalha da castidade, me diziam: “É impressionante! Segui o conselho que me
deu, de invocar Nossa Senhora na hora da tentação - “Mãe puríssima, rogai por
mim!”, “Mãe castíssima, rogai por mim!” - e consegui vencer muitas vezes e
ficar com uma paz que antes não conhecia”.
Adaptacão de
trechos do livro de F.Faus: Autodomínio. Elogio da temperança