É bom gostar e curtir as esperanças fundadas na certeza de que Deus nos fez. Gostamos de ano novo, roupa nova, carro novo, gente nova e
bonita, ruas limpas, cidade organizada. Ninguém foi feito para curtir o
desgaste e a feiura. Alegra-nos pensar que nascem de novo nossas esperanças
quando se abre o mês de janeiro. É muito bom gostar e curtir as esperanças
fundadas na certeza de que Deus nos fez para um mundo digno e bem tratado.
Fomos feitos para a felicidade!
Contudo, muitas esperanças são frustradas devido ao choque
com a dura realidade, de forma a gerar em muitas pessoas um pessimismo crônico
diante dos acontecimentos e do mundo. Quando todos os municípios de nosso país
acolheram novos representantes para o poder legislativo e novos prefeitos à
frente do executivo, sensações contraditórias tomaram conta dos cidadãos. De um
lado, é sempre o novo que vem à tona, cheio de promessas. Mas o refrão repetido
tantas vezes da desconfiança nos políticos pode esvaziar o entusiasmo. Mais ao
nosso alcance cotidiano, emprego novo ou primeiro emprego, aumento de salário,
volta de férias, novo chefe na repartição, casa diferente, transferência, o
casamento esperado. As surpresas estarão à nossa espera nos próximos doze
meses, um dia depois do outro. E a cada dia basta o seu cuidado (Cf. Mt 6,34)!
Por que tantas inquietações tomam conta de nosso coração? Erramos o alvo ao
apostar no que é novo e promissor? Quais as razões para as muitas frustrações?
Como preveni-las?
Nas últimas semanas, muitas pessoas arrumaram a casa e a
vida para o fim do mundo, que não veio. Outras correram avidamente às previsões
das várias categorias de adivinhos disponíveis no mercado! E muita gente ganhou
dinheiro com tais oráculos! Os cristãos que fizeram a opção por seguir Jesus
Cristo e querem viver o Evangelho com seriedade se encontram numa situação
diferente. O ensinamento da Carta de São Pedro revela-se oportuno: “Ora, quem é
que vos fará mal, se vos esforçais por fazer o bem? Mais que isso, se tiverdes
que sofrer por causa da justiça, felizes de vós! Não tenhais medo de suas
intimidações, nem vos deixeis perturbar. Antes, declarai santo, em vossos
corações, o Senhor Jesus Cristo e estai sempre prontos a dar a razão da vossa
esperança a todo aquele que a pedir” (1 Pd 3,13-15). Nosso convite de início do
ano é para que todos cheguem justamente a compartilhar as razões da esperança.
De esperanças passamos à Esperança. Esta é a chave! Não
apostamos nossa vida no sucesso aparente do lucro ou da vitória garantida e
fácil. Não confundimos salvação com prosperidade imediata, não queremos chamar
Deus à obra de nossas mãos (Cf. Os 14,4). Se porventura o ano que começa nos
encontrar na cruz, que a mesma fé e a mesma confiança em Deus subsistam em nós!
Esperança é virtude teologal, dada de presente no Batismo. Trata-se de viver na
esperança, não apenas de esperanças. Viver com a mesma firmeza, na luz ou na
escuridão, diante da vida ou da morte, fortes ou fracos, segurando nas mãos de
Deus.
A prática do bem e das diversas virtudes humanas, a serem
exercitadas no dia a dia do ano novo, tem seu fundamento nas chamadas virtudes
teologais (Cf. Catecismo da Igreja Católica, números 1812-1829), as quais
fundamentam e orientam as ações dos cristãos. São dadas por Deus para que
sejamos capazes de agir como seus filhos e merecer a vida eterna. São elas a
Fé, a Esperança e a Caridade.
Com a virtude da Esperança, desejamos como nossa felicidade
o Reino dos Céus e a vida eterna, colocando nossa confiança nas promessas de
Cristo e apoiando-nos no socorro da graça do Espírito Santo, mais do que em
nossas forças. “Continuemos a afirmar a nossa esperança, sem esmorecer, pois
aquele que fez a promessa é fiel” (Hb 10,23). “Este Espírito, ele o derramou
copiosamente sobre nós por Jesus Cristo, nosso Salvador, para que, justificados
pela sua graça, nos tornemos, na esperança, herdeiros da vida eterna” (Tt
3,6-7). A aspiração à felicidade, plantada por Deus em nossos corações, é
respondida pela virtude da esperança. Com ela, todas as expectativas que
inspiram as nossas atividades são assumidas e ganham sentido. A partir dela,
são purificadas as intenções, equilibrados os impulsos e eventuais exageros,
moderada a concupiscência. Vale, sim, esperar o dia de amanhã, a aprovação num
concurso, a casa nova e toda uma lista de coisas boas. Tudo encontra o seu
lugar quando não é absolutizado. Só a escolha do seguimento de Jesus Cristo,
aquele que é a única esperança, pode dimensionar adequadamente nossos afetos e
sonhos.
“Espera, ó minha alma, espera. Ignoras o dia e a hora. Vigia
cuidadosamente, tudo passa com rapidez, ainda que tua impaciência torne
duvidoso o que é certo e longo um tempo bem curto. Considera que quanto mais
pelejares, mais provarás o amor que tens a teu Deus e mais te alegrarás um dia
com teu Bem-Amado em gosto e deleite que não podem ter fim” (Santa Teresa de
Jesus, excl. 15,3). Para esta serenidade, é necessário confiar além do tempo e
das vicissitudes dos dias que correm. O cristão, certo de que a “esperança é
como uma âncora segura e firme” (Hb 6,19), tem a garantia de que o ano que
começa será o melhor de todos e os que se seguirem, melhores ainda!
Dom Alberto Taveira Corrêa
Arcebispo de Belém - PA